quarta-feira, novembro 07, 2012

OCASIONALMENTE

Ocasionalmente... rimos,
temos prazer quando sóbrios, fazemos sentido,
somos criativos, construímos,
sonhamos mas também agimos.
Ocasionalmente fazemos dieta, ginástica,
aprendemos, celebramos,
temos dias, datas marcadas, damos,
somos quem realmente somos,
quem queremos ser.
Ocasionalmente damos beijos, abraços, carícias,
dizemos "amo-te", "obrigado" e "desculpa",
gostamos da imagem reflectida no espelho,
Ocasionalmente somos pais, filhos,
casais e amantes, irmãos,
gente que sente, humanos.
Ocasionalmente fazemos amor,
não apenas sexo, pensamos, agimos,
procuramos o certo,
somos solidários, partilhamos.
Ocasionalmente, mais do que respirar, vivemos.
Ocasionalmente... nem sempre.

domingo, outubro 07, 2012

VIRADOS DO AVESSO

Realmente, não sei como ainda me surpreendo com o estado a que chegaram as coisas não só em Portugal, como na Europa e não só, ao nível da política, do estado social, como ainda das mentalidades. Está tudo virado do avesso, à imagem da bandeira que tanto nos diz, hasteada negligentemente por duas pessoas com tão altas altas responsabilidades e que não tão poucas vezes primam por meter os pés pelas mãos. Mas não é apenas o mau presságio e a pulga atrás da orelha que fica de cada discurso de Passos Coelho, ou o efeito xanax dos monólogos de Vitor Gaspar, de consequências tão terríveis e funestas como o atentado de hiroshima, que me trazem hoje preocupado como ainda revoltado. Grandes poderes trazem sempre grandes responsabilidades, mas infelizmente, aqueles que têm o poder e a disponibilidade dos meios de comunicação pecam na maioria dos casos por não servirem de exemplo a ninguém, deixando no ar a ideia de que o barco em que o nosso futuro navega anda à deriva, no completo desnorte daqueles que mandam por mandar, cegos a alternativas que não sejam as suas ideias egocêntricas e quase sempre infrutíferas como tiros de pólvora seca. Tiros no pé, foram dados aqui tão perto de nós, por um conselheiro do governo espanhol, de 71 anos, que disse apenas esta pérola de sabedoria: "As mulheres são como as leis, foram feitas para serem violadas". Meu caro José Manuel Castelao Bragaño, permita-me, num dos poucos direitos adquiridos que ainda não nos foram espoliados, o da liberdade de expressão, afirmar que o senhor é um ignorante, e que o facto de ter apresentado demissão pouco depois destas afirmações de nada lhe vale nem limpa a nódoa da verborreia de que foi acometido em tão infeliz momento. Meu caro senhor, em 2012, nos antípodas da idade da pedra e dos instintos mais básicos, as pessoas regem-se por regras, usam as palavras como armas e cospem nas violações, de leis, mas principalmente de mulheres. Por onde andou enquanto o mundo evoluía?

quarta-feira, setembro 05, 2012

MORRER POR AMOR?


MORRER POR AMOR?


"A Millionaire's First Love" é o título de um drama sul-coreano, daqueles que deixam os nossos olhos marejados de lágrimas rebeldes, por mais insensíveis que queiramos parecer. É a típica história do rapaz rico e da rapariga pobre, que a princípio parecem não encaixar mas que acabam inevitavelmente por se apaixonarem. Como é previsível neste tipo de filmes, o final feliz encalha sempre num "mas", cujo fundamento costuma ser o de fazer o filme render durante hora e meia a duas horas. Geralmente esse "mas" é um terceiro elemento, o terceiro vértice de um triângulo amoroso. Não nesta história. Quando tudo parecia ter tudo para dar certo, descobrimos que a rapariga doce e frágil sofre de uma doença incurável e que as emoções fortes, como amar, podem apressar o seu trágico destino. É aqui que eu quero chegar, apesar do filme valer por muito mais do que apenas isto. Quanto vale a vida? Quanto vale um grande amor? Deveria o rapaz apostar tudo no sentimento que, unindo-os, iria acabar irremediavelmente por separá-los precocemente? Com que direito? Deverá o amor ser tão egoísta, ao ponto de se sobrepor à própria vida? E de que vale a vida se tivermos de abdicar dos sentimentos? Na ficção como na realidade, são muitos os casos de quem sacrifica a sua vida por amor, de quem abdica da sua felicidade em troca da felicidade da pessoa amada, mas será essa extrema demonstração de altruísmo ainda válida nos dias de hoje? Morrer por amor, como se não houvesse nada mais importante na vida. E matar? Será sensato ou sequer legítimo - e já não falo das mortes por ciúmes ou apenas baseadas em leves suspeitas - amar, mas amar de tal forma intensa, mesmo sabendo que, como no caso do filme, esse amor irá abreviar a vida de quem amamos mais do que a nós mesmos? Quanto vale a vida? Quanto vale o amor? Ficar ou partir, matar ou morrer (por não poder amar). Muito mais conhecido do que este filme é "A Walk To Remeber", baseado no romance de Nicholas Sparks, onde a filha do pastor de uma pequena cidade ajuda o protagonista a ensaiar para uma peça, na condição de que ele não se apaixone por ela, que sofre de leucemia e que, acaba numa corrida contra o tempo, de modo a conseguir concretizar todos os sonhos dela antes de morrer. Será amar então mais importante do que - não diria viver, mas antes sobreviver? Francisco Moita Flores disse o seguinte: "...a morte é a ausência do beijo, do abraço, do toque, do cheiro de uma pessoa...".


E eu assino por baixo. De que vale uma vida longa se o amor nos for negado?
 
(retirado de um texto meu em A Voz das Palavras)

terça-feira, abril 24, 2012

ONTEM, HOJE E AMANHÃ

"Ontem eras a menina mais alegre e mais bonita que eu já conheci"

Nasci antes do 25 de Abril de 1974, não muito. Não tanto que me possa recordar de quaisquer factos que se tenham passado naqueles dias tão importantes para a nossa história, que me permitam dizer com maior ou menor exactidão onde estava eu no 25 de Abril de 1974. O que sei, aprendi nos livros da escola e naquilo que fui perguntando aos meus pais e a conhecidos que viveram de perto esses dias. Quis saber o que sentiram, da importância, da razão das lágrimas nos olhos, da alegria e da tristeza, da luta sem sangue derramado por um futuro que me parece sempre adiado, cada vez mais escondido numa gaveta esquecida lá no Palácio de São Bento, tão presente nas minhas memórias, não pouco o tempo que passei numa casa dum prédio situado mesmo em frente, com uma vista privilegiada, que fomentava os meus sonhos do menino que fui... ontem. Do pouco que sei e do muito que ouvi, sei da cor viva de um País renascido, dos ideais de esperança de um povo até aí como o fado, cinzento e triste. A Revolução, os cravos, os militares que resgataram a crença em amanhãs melhores, são tudo imagens que fazem parte das minhas memórias. Foi bonita a festa, pá! Da opressão e da censura, da pide e do homem que governava sozinho até à tão ansiada liberdade foi um passo bem maior que o dado por Neil Armstrong em solo lunar, mas não menores em importância. Os militares libertaram um país descrente, os políticos tomaram o poder e criaram a democracia, a liberdade de expressão, deram-nos direitos e um motivo para sonhar. Ontem, o país tinha finalmente uma face alegre e bonita, resplandecente. Depois, não muito, entre os vivas à democracia e os feitos dos heróis recentes, já se ouviam alguns queixumes - não se confunda com nostalgia, mas queixumes - de que o país das maravilhas de Alice não era assim tão maravilhoso, nem o futuro uma estrada radiosa, sem sobressaltos. Quais velhos do Restelo, sussurravam já não entredentes como no antigo regime: "antigamente... antigamente havia trabalho para quem queria trabalhar, o pouco que se ganhava dava para comprar mais do que se compra hoje, havia agricultura e pesca, e até a comida tinha outro sabor. O Benfica e o Sporting ganhavam mais campeonatos." O país que era governado por um ditador estava agora dividido nas teias do poder político, entre a direita e a esquerda, norte e sul, poder e oposição, numa guerra onde o povo - pelo qual se fez a revolução - estava sempre ou quase sempre à margem, excepto nas campanhas eleitorais, nas promessas já tão gastas de tão repetidas, enquanto as nossas riquezas e recursos eram delapidados. Amanhã comemora-se uma vez mais uma festa que devia ser de todos, mas especialmente do povo, a consagração de tantas conquistas que nesse dia e nos seguintes se fizeram, mas o presente já não é tão colorido como ontem e o futuro é sombrio, carregado de medos e incertezas. Onde páram os ideais de 74, agora que até as suas figuras proeminentes se afastam das comemorações oficiais? Haverá ainda algum Salgueiro Maia, algum D.Sebastião renascido das brumas que nos devolva a esperança e tudo aquilo por que lutámos e um dia conquistámos? Onde pára a esperança de um amanhã melhor, um futuro para nós e para os nossos filhos?