"Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem ideias, não vamos a parte nenhuma."
José Saramago, escritor português, Prémio Nobel, já não está entre nós. A frase com que abro esta postagem foi um dos seus últimos testemunhos, uma das suas derradeiras ideias. Sem ser uma personagem consensual - longe disso -, José Saramago era um homem de ideias e de ideais. Enquanto que a maior parte de nós luta diariamente por um pouco de atenção, pelo olhar atento, pelo reconhecimento pelos outros daquilo que fazemos, por amor, por uma simples e rápida atenção sobre nós, existem, por outro lado uns poucos que fazem da sua vida uma guerra aberta contra o mundo, contestando tudo e todos, chamando a atenção das "luzes" pelo ódio, pelo confronto, pela polémica. Saramago nunca foi um dos meus escritores de eleição, uma das minhas referências enquanto homem.
Como Mourinho, Saramago era um homem de antagonismos, de uma personalidade forte e, como o novo treinador do Real Madrid, era um homem de conquistas. Talvez o mundo não aprecie particularmente os homens com ideias, aqueles que poem em causa verdades e conceitos pré-concebidos. Sem o admirar nem concordar em muito do que dizia ou fazia, reconhecia nele essa capacidade que poucos têm de poderem transformar, a força necessária para sacudir as teias de aranha de certas mentalidades tacanhas, a defesa intransigente dos seus ideais. A literatura ficou hoje mais pobre, Portugal - esse mesmo Portugal tão criticado por Saramago - e o mundo ficaram mais pobres com a sua morte.