sexta-feira, junho 03, 2016

FEIOS, PORCOS E MAUS... E AINDA POR CIMA DESDENTADOS (ou uma viagem do Portugal profundo ao Brasil dos morrtos e favelas, passando pela lua até à India)

Num comentário ao que de mais relevante me marcou esta semana começo pelas mais de três dezenas de selvagens que violaram uma jovem de 16 anos no Brasil e não satisfeitos, ainda publicaram o vídeo da sua façanha (?) nas redes sociais. Já as habituais vozes se levantaram a dizer que foi consensual, que a rapariga agira ou vestia de forma a instigar tal comportamento repugnante e ultrajante, mas que não é mais do que um daqueles crimes sem perdão para os quais qualquer castigo por mais doloroso será sempre pouco. Afinal que mundo é este que trata as mulheres como objectos sexuais, como se fossem seres de segunda e não merecedores dos mesmos direitos e respeito que os homens? Evoluímos, dizem alguns, deixámo-nos dos preconceitos e falsos moralismos do passado, inventámos a roda e a matemática, aprendemos a diferença entre o certo e o errado, fomos à lua. Então o que motiva comportamentos como estes? Não somos selvagens só porque nunca vimos o mar ou sentimos a neve no rosto ou por sermos desdentados. Não somos melhores ou piores por termos educação, mais ou menos dinheiro, por sermos brancos ou negros, homens ou mulheres. Natureza humana? A verdade é que à primeira tentação damos primazia aos nossos instintos mais básicos e selvagens como se ainda vivessemos em cavernas fazendo fogo com dois pedaços de madeira. Deve a mulher em alternativa deixar de se cuidar, tapar-se até ao pescoço, esconder as formas porque de outra forma estará a incentivar a violação? Mas o piropo é que é crime. Envergonhem-se os senhores da justiça e do progresso! Não pode uma mulher entrar num autocarro repleto de homens sem correr o risco de ser violada ou assassinada? Homem que é Homem não se deixa guiar pelo instinto, não bate na mulher, não impoe a sua vontade contra a vontade alheia, não viola, não se escuda em acções injustificadamente incontroláveis para satisfazer desejos egoístas. Que sociedade é esta sem moral, tão depravada, conspurcada por um desejo insaciável de ambição, de corrupção, de direitos isentos de deveres, de uma sede egoísta de poder que não vê limites e que continua a passear-se incólume e sem remorsos sobre um mar imenso de crimes hedíondos e pecados atrozes, enquanto as beatas criticam decotes junto ao altar.

domingo, setembro 06, 2015

FILHOS DA GUERRA - ANJOS CAÍDOS



 I

Podia começar por falar em destino, mas o destino não tem nada a ver com isto. Nem o destino nem a sorte ou o azar de ter nascido na Síria, no Iraque, na Palestina, como na Bósnia ou na Ucrânia, etc etc etc. Continuo a pensar que o destino somos nós que fazemos e esta criança não teve tempo para sonhar, muito menos para fazer fosse o que quer que fosse com a sua vida. Ninguém planeia morrer aos três anos numa praia da Turquia... ou noutra qualquer. Aylan é um de tantos filhos da guerra, anjos caídos, uma das mais recentes e provavelmente a mais mediática vítima entre os refugiados de mais um dos inúmeros conflitos que assolam este nosso planeta azul, que, tal como a lua é cada vez mais - e apenas - bonito e inspirador se visto ao longe. Não que o nome interesse. Não interessa nesta idade como não interessará aos vinte anos, assim como no ocaso de uma vida "normal", para lá dos 70's. No fundo, só importa aquilo que fazemos. Nós não escolhemos o nosso próprio nome, não escolhemos ser bonitos ou feios, altos ou magros, louros ou morenos, de olhos azuis ou castanhos. Também não escolhemos ser homens ou mulheres, brancos ou pretos, europeus ou americanos, árabes. E no entanto sabemos como esse destino em que não acredito está tão interligado à importância dita menor destes detalhes que de pormenores nada têm. Pormaiores, talvez. Ninguém escolhe nascer no meio da guerra ou da fome. Aylan não teve nas suas mãos o poder da escolha, aquilo que realmente importa que é o que fazemos da vida. Cada escolha, cada decisão, leva-nos ao que queremos ser e fazer pelos outros, por um mundo melhor ou pior, faz-nos ser bons ou maus, cair e levantar, deixar uma marca, memórias, vivermos para além da nossa existência física. Este menino a quem a infância - muito provavelmente limitada e atribulada - foi roubada em tão tenra idade não teve tempo para muito, porventura para brincar tampouco, mas a sua imagem largado das águas naquela praia da Turquia, para lá de qualquer questão moral, poderá ajudar a mudar consciências, a sensibilizar todos aqueles que podem mudar - todos nós - muito ou pouco, sendo que o pouco é melhor do que o desagrado geral das vozes que protestam e dos braços que se quedam invariavelmente cruzados sem nada fazerem porque podem pouco. O mundo não evoluiu com um cruzar de braços, a roda e o fogo não nasceram da inércia. Não basta ficarmos chocados a assistir enquanto milhares de Aylan's vão desperdiçando as suas vidas escorraçados de suas próprias casas, ao sabor das balas, da violência e do ódio, para longe das suas raízes à procura de um futuro cujo prazo de validade seja superior a três anos. Será que a humanidade atingiu um ponto em que continua a ser normal criar barreiras, hostilizar, discriminar tudo o que nos é diferente, pessoas, religiões, ideias? Será que após anos e anos de "evolução" continua a imperar o espírito das cruzadas, dos campos de concentração para aqueles que não são de raça pura, a perseguição das bruxas pela inquisição, o klu klux klan? Se o amor, o respeito e a compreensão são palavras vãs deveria ser proibido nascer nos países em guerra...

quinta-feira, janeiro 09, 2014

DOS CHEIROS E SONS DA ESCRITA

 
Já não escrevo como escrevia, pensei, após meia dúzia de linhas escritas quase à pressa. Faltam-me os cheiros como me faltam os sons, do que antes parecia uma obrigação e era apenas prazer, necessidade. Bate-me hoje forte a saudade de escrever directamente na folha branca ou, como mais tarde o fazia, do martelar sincronizado das teclas da máquina de escrever, de ver cada folha por mais alva tingir-se, não de palavras, mas de sentimentos, de sonhos desfeitos pelo tempo, de sonhos a tempo de serem bem mais que sonhos, de esperança, riso e lágrimas, de vida, umas vezes vivida, outras... apenas pensada.

quinta-feira, março 28, 2013

DE SÃO E DE LOUCO...


qual será a nossa verdadeira natureza?
Hoje, recordei aquela antiga teoria de que qualquer um de nós pode matar outra pessoa, associando-a a histórias como a de Jekyll and Hyde e tantas outras, verosímeis ou não que nos deixam sempre de boca aberta, tal a capacidade do Homem em espantar-nos com atitudes indignas mesmo do nosso antepassado e primitivo habitante das cavernas. Seremos essencialmente bons ou maus? Qual será a nossa verdadeira natureza, os nossos instintos mais latentes? Nos Estados Unidos, uma mãe matou o próprio filho, de três meses, porque o choro da criança estava a incomodá-la, enquanto jogava ao Farmville. Ela confessou às autoridades ter abanado o bebé, fumando um cigarro em seguida, na tentativa de se acalmar, mas tornando a abaná-lo até ao desfecho fatal. Talvez seja mesmo verdade que qualquer um possa matar, como até roubar. Experimentem ter uma família sem recursos de subsistência, perderem o trabalho, verem os filhos doentes, chorando com fome... Uma das consequências do agravamento do poder de compra e de uma crise cujo fim não se vislumbra - antes pelo contrário - será, certamente, fazer aumentar a criminalidade. Simples lógica dedutiva. Matar não será acto de uma sequência tão racional - na maior parte das vezes -, obedece sobretudo a motivações, fruto de um instante, de uma loucura que nos tolda os sentidos e nos traz à flor da pele os impulsos mais irracionais e primitivos, que julgávamos não existirem, depois de anos e anos de evolução e educação. Culpar o Facebook e os seus jogos soa-me a uma desculpa tão frágil como associar a criminalidade à violência dos filmes. Resta sempre o stress, tão conveniente para justificar todas as nossas emoções mais instáveis, as fúrias súbitas, o mau humor e a falta de paciência, a luta diária por uma vida - ou sobrevivência - pelo menos no limiar da dignidade. Sei que os dias parecem cada vez mais curtos, independentemente da mudança da hora que aí vem, que o tempo que temos se transformou numa corrida diária, de tarefas cronometradas ao segundo. São os transportes,  as relações, as refeições já sem a família toda junta, sem tempo sequer para nos sentarmos, o fast-food, o fast-fuck, a televisão a silenciar o diálogo, os relógios de ponto e o medo do futuro, tudo num ritmo vertiginoso - time is money - como uma volta num carrocel que teima em não parar, onde qualquer descuido, qualquer falta de atenção podem ser suficientes para um game over. Uma espécie de tortura psicológica, em que matar ou morrer chega a parecer para muitos natural e razoável, mesmo lógico. Não para mim. Natural, razoável é jogar um jogo na internet de vez em quando como forma de distracção, assistir a um bom filme, mas sem usar esses devaneios como uma concha onde nos escondemos e sentimos imunes e tantas vezes impunes, sem cair no vício de aí permanecermos horas e horas, especialmente quando há uma vida que tantas vezes nos passa despercebida, de pormenores, de convívio com pessoas reais, amigos, família, que não têm culpa do ritmo frenético, dos humores inconstantes e que não têm por isso de ser transformados em reféns de uma guerra interior, invisível, tendo de chorar ou preencher formulários por um pouco da nossa atenção e boa disposição. Um jogo não é mais do que isso mesmo, algo onde ganhamos ou perdemos, morremos e recomeçamos, onde temos a opção de carregar no pause de cada vez que quisermos. A vida não tem essa opção, por isso cada minuto conta tanto, cada minuto deve ser valorizado como um milagre, uma benção. Um passeio ao ar livre, uma ida ao cinema, um jogo de computador - em família, dialogar, amar, podem fazer muito mais por nós que uma embalagem de Valium ou de Xanax.

O MUNDO É UM DIA ATRÁS DO OUTRO...

... onde acordar, o simples facto de estar vivo pode ser o maior acontecimento do dia.


O despertador toca às 5h20 e apanha-o acordado desde as 5, fazendo tempo para se levantar, o que só acontece pelas 5h30, dia sim dia sim. Os breves rituais de limpeza não costumam exceder os 10/15 minutos, excepção para aqueles dias em que a máquina de barbear fica sem carga e o deixa mal-humorado, pelo inesperado da situação. Não gosta de surpresas. Às 5h50 está já fardado e pronto a sair de casa. As poucas pessoas que encontra pelo caminho são já caras conhecidas, embora não haja trocas de palavras entre eles. Ainda com tempo, toma o primeiro café da manhã no local do costume, passando a vista pelo jornal, o mesmo que compra desde que começou a ter dinheiro para as suas próprias despesas. O relógio de ponto responde com um inexpressivo "obrigado" à picagem de "entrada ao serviço", que espera vir a decorrer dentro da normalidade, de gestos que se repetirão durante as oito horas seguintes e que conhece já de cor, mesmo as reacções quase sempre imprevisíveis do chamado factor humano, mas que ele aprendeu a prever, como um bom psicólogo. Um bom dia de trabalho para um funcionário competente é aquele que não traz surpresas. O relógio volta a ditar as suas leis, quase ininterruptamente, porque tudo tem uma hora certa, mesmo o intervalo para a refeição, cronometrado quase ao segundo. Quase se deixa apanhar desprevenido pelo tempo para o lazer, maioritariamente partilhado pela família, que o obriga a fazer concessões a um descanso merecido mas constantemente adiado pela azáfama do lar. Quase sente saudades do trabalho. Ouve o telejornal, que, conjuntamente com aquilo que ouviu de amigos e colegas no trabalho, desconhecidos na rua e o relatório sobre as novidades da vizinhança, diariamente transmitidas pela esposa, vão formar a sua opinião, acostumado que está a tomar como verdade inquestionável tudo o que lhe dizem, tudo o que ouve. Pensar exige muito trabalho e tempo que não possui. Tem consciência dos poucos minutos que dedicou aos filhos, mas não quis incomodá-los enquanto gastavam largas horas do seu tempo lúdico em frente ao computador e à playstation, com os seus inúmeros amigos mais ou menos virtuais. Vai-se deitar pelas 23h00, sozinho, depois de um beijo rápido à esposa, que "agarrada" à televisão mal deu por ele. Durante a semana as telenovelas acabam mais tarde, pelo que a necessidade de descanso obriga a que só possa fazer sexo aos feriados e fins de semana, quando está de folga no dia seguinte ou uma rapidinha quando não está e nem dói a cabeça à Maria.
Há pessoas assim, fechadas no seu mundo perfeito, avessas ao pensamento próprio, às mudanças, às surpresas e aos sonhos, que provavelmente trariam desilusões. Quem não sonha dificilmente sofrerá, por não ter expectativas. Poderiam descrever os seus dias numa tabela, como num horário escolar em que cada disciplina obedece a um horário próprio; Pessoas para quem a vida é um jogo com princípio, meio e fim, onde depois de transpostos alguns níveis mais ou menos exigentes (infância, escolaridade, namoro, serviço militar, profissão, casamento, filhos), se protegem na saída fácil da rotina diária e sem surpresas, onde os maiores picos de excitação são as "discussões" sobre os resultados da bola, as peripécias das telenovelas ou o dia a dia de uma vizinhança com mil defeitos. Há pessoas assim, adormecidas em vida, daquelas que não fazem acontecer, adaptam-se simplesmente, deixam-se levar pela maré, um exército imenso de "yes man", pouco mais que máquinas, num mundo cada vez mais globalizado, a matar o génio, o livre-pensamento e a individualidade.

domingo, outubro 07, 2012

VIRADOS DO AVESSO

Realmente, não sei como ainda me surpreendo com o estado a que chegaram as coisas não só em Portugal, como na Europa e não só, ao nível da política, do estado social, como ainda das mentalidades. Está tudo virado do avesso, à imagem da bandeira que tanto nos diz, hasteada negligentemente por duas pessoas com tão altas altas responsabilidades e que não tão poucas vezes primam por meter os pés pelas mãos. Mas não é apenas o mau presságio e a pulga atrás da orelha que fica de cada discurso de Passos Coelho, ou o efeito xanax dos monólogos de Vitor Gaspar, de consequências tão terríveis e funestas como o atentado de hiroshima, que me trazem hoje preocupado como ainda revoltado. Grandes poderes trazem sempre grandes responsabilidades, mas infelizmente, aqueles que têm o poder e a disponibilidade dos meios de comunicação pecam na maioria dos casos por não servirem de exemplo a ninguém, deixando no ar a ideia de que o barco em que o nosso futuro navega anda à deriva, no completo desnorte daqueles que mandam por mandar, cegos a alternativas que não sejam as suas ideias egocêntricas e quase sempre infrutíferas como tiros de pólvora seca. Tiros no pé, foram dados aqui tão perto de nós, por um conselheiro do governo espanhol, de 71 anos, que disse apenas esta pérola de sabedoria: "As mulheres são como as leis, foram feitas para serem violadas". Meu caro José Manuel Castelao Bragaño, permita-me, num dos poucos direitos adquiridos que ainda não nos foram espoliados, o da liberdade de expressão, afirmar que o senhor é um ignorante, e que o facto de ter apresentado demissão pouco depois destas afirmações de nada lhe vale nem limpa a nódoa da verborreia de que foi acometido em tão infeliz momento. Meu caro senhor, em 2012, nos antípodas da idade da pedra e dos instintos mais básicos, as pessoas regem-se por regras, usam as palavras como armas e cospem nas violações, de leis, mas principalmente de mulheres. Por onde andou enquanto o mundo evoluía?

terça-feira, abril 24, 2012

ONTEM, HOJE E AMANHÃ

"Ontem eras a menina mais alegre e mais bonita que eu já conheci"

Nasci antes do 25 de Abril de 1974, não muito. Não tanto que me possa recordar de quaisquer factos que se tenham passado naqueles dias tão importantes para a nossa história, que me permitam dizer com maior ou menor exactidão onde estava eu no 25 de Abril de 1974. O que sei, aprendi nos livros da escola e naquilo que fui perguntando aos meus pais e a conhecidos que viveram de perto esses dias. Quis saber o que sentiram, da importância, da razão das lágrimas nos olhos, da alegria e da tristeza, da luta sem sangue derramado por um futuro que me parece sempre adiado, cada vez mais escondido numa gaveta esquecida lá no Palácio de São Bento, tão presente nas minhas memórias, não pouco o tempo que passei numa casa dum prédio situado mesmo em frente, com uma vista privilegiada, que fomentava os meus sonhos do menino que fui... ontem. Do pouco que sei e do muito que ouvi, sei da cor viva de um País renascido, dos ideais de esperança de um povo até aí como o fado, cinzento e triste. A Revolução, os cravos, os militares que resgataram a crença em amanhãs melhores, são tudo imagens que fazem parte das minhas memórias. Foi bonita a festa, pá! Da opressão e da censura, da pide e do homem que governava sozinho até à tão ansiada liberdade foi um passo bem maior que o dado por Neil Armstrong em solo lunar, mas não menores em importância. Os militares libertaram um país descrente, os políticos tomaram o poder e criaram a democracia, a liberdade de expressão, deram-nos direitos e um motivo para sonhar. Ontem, o país tinha finalmente uma face alegre e bonita, resplandecente. Depois, não muito, entre os vivas à democracia e os feitos dos heróis recentes, já se ouviam alguns queixumes - não se confunda com nostalgia, mas queixumes - de que o país das maravilhas de Alice não era assim tão maravilhoso, nem o futuro uma estrada radiosa, sem sobressaltos. Quais velhos do Restelo, sussurravam já não entredentes como no antigo regime: "antigamente... antigamente havia trabalho para quem queria trabalhar, o pouco que se ganhava dava para comprar mais do que se compra hoje, havia agricultura e pesca, e até a comida tinha outro sabor. O Benfica e o Sporting ganhavam mais campeonatos." O país que era governado por um ditador estava agora dividido nas teias do poder político, entre a direita e a esquerda, norte e sul, poder e oposição, numa guerra onde o povo - pelo qual se fez a revolução - estava sempre ou quase sempre à margem, excepto nas campanhas eleitorais, nas promessas já tão gastas de tão repetidas, enquanto as nossas riquezas e recursos eram delapidados. Amanhã comemora-se uma vez mais uma festa que devia ser de todos, mas especialmente do povo, a consagração de tantas conquistas que nesse dia e nos seguintes se fizeram, mas o presente já não é tão colorido como ontem e o futuro é sombrio, carregado de medos e incertezas. Onde páram os ideais de 74, agora que até as suas figuras proeminentes se afastam das comemorações oficiais? Haverá ainda algum Salgueiro Maia, algum D.Sebastião renascido das brumas que nos devolva a esperança e tudo aquilo por que lutámos e um dia conquistámos? Onde pára a esperança de um amanhã melhor, um futuro para nós e para os nossos filhos?

sexta-feira, outubro 29, 2010

PARA FINALIZAR... SOBRE COMEÇOS E TUDO O QUE HÁ PELO MEIO

 (uma adenda ao post anterior)

O que cada começo tem de pior/melhor não é o estar-lhe quase sempre inerente a obrigatoriedade de um fim, mas que, até o aingir existe um percurso  mais ou menos longo de descobertas e marcos/datas, experiências, aromas cujo sabor agridoce fazem reabrir profundas e inevitáveis feridas. Quisesse esquecê-las e tudo seria mais fácil, bastaria tão simplesmente trocar os nomes às coisas, amor por paixão, emoção por razão. Mas assim não teria memórias e um homem sem memórias ou sonhos é um homem nu, despido de fé, um saco vazio ao sabor do vento, sem vontade própria nem vida a que possa chamar sua. Assim, por opção ou casmurrice, contra a lógica do bom senso e os conselhos de quem sempre se preocupa, segue desafiando a estatística das probabilidades, dando ouvidos a quem não vê e raramente pensa: o coração.

MEMÓRIAS DE UM OUTRO OUTUBRO

Pode um amor sobreviver depois de começar com uma mentira? E se a mentira até tiver sido inocente, daquelas que não fazem mal a ninguém? Naquela tarde, três anos antes, a tarde estava bem melhor do que esta manhã em que a chuva caiu impiedosamente. Ele tinha acabado de cortar o cabelo, bem curto, apesar do tempo já fresco, e caminhava a passos largos - a única forma que ele sabia andar - para casa, quando o telemóvel tocou e lhe disseram que alguém tinha perguntado por ele. Sorriu, iluminando-se por dentro. As expectativas criadas no último par de dias pareciam ir concretizar-se, apenas não sabendo o seu alcance. Ligou-lhe de volta. 
- Já tenho aquilo para lhe entregar. - disse ela - Entrego amanhã à sua mãe?
Hesitou, sabendo que assim não teria hipóteses de vê-la, devido ao horário de trabalho. Não podia deixar para amanhã. A vida nunca deve ser deixada para depois.
- Podiamos encontrarmo-nos agora, para um café. - alvitrou - Eu ía agora beber um (mentira) e estou perto aí de casa (segunda mentira). Se quiseres...
Pouco depois encontravam-se pela primeira vez sozinhos, surpreendentemente familiares, inesperadamente - nele - faladores, parecendo quererem saber tudo um do outro no mínimo espaço de tempo. Tanto que, durante os dias seguintes não deixaram de se encontrar e bastou um par de dias para passarem da amizade àquele patamar mais elevado, que a urgência das suas afinidades e sentimentos deixava claramente perceber. Quantos dias são precisos para nos apaixonarmos? Três anos se passaram, numa relação intensa e marcada por altos e baixos que se arrastavam por vezes durante largos meses, fruto de duas personalidades difíceis, de uma teimosia estúpida que deixou que tanto tempo se lhes escapasse das mãos e dos anos. Depois bastava uma mensagem, nem sempre, mas quase sempre dele e tudo voltava ao normal, porque no fundo - parecia - tinham sido feitos um para o outro. Acreditamos em tudo quando estamos apaixonados, não enxergando muitas vezes aquilo que está bem diante do nosso nariz. Diz ele que no dia em que deixar de acreditar em tudo o que viveu - e foram os melhores três anos da sua vida -, em tudo o que foi dito, em finais felizes, a vida não terá mais sentido, porque sem sonhos, o horizonte é negro e sombrio como a manhã que hoje o despertou, três anos volvidos. Pode um amor morrer sem uma razão específica e válida deixando atrás de si apenas uma amizade ténue? Podem duas pessoas , depois de muitas promessas e planos, nas vésperas de uma vida em comum descobrirem pura e simplesmente que estavam enganadas o tempo todo? Pode o amor ser tão inconsequente e frágil, soçobrar às primeiras rajadas fortes de um Outubro agreste?

segunda-feira, outubro 18, 2010

HEAR ME

Hear Me é um belíssimo exemplo do bom cinema que se continua a fazer na Ásia, não apenas na Coreia do Sul, China ou Japão, mas também em Taiwan - Spider Lilies, Three Times...-, de onde é originário este filme de 2009, que conta a história de Yang Yang (Ivy Chen) e Tian Kuo (Eddie Peng), dois jovens para quem os problemas de comunicação parecem pôr em causa a felicidade dos dois e os sentimentos entre eles. Quase silêncioso, o filme vive muito da linguagem gestual entre a maioria dos personagens - com as legendas a serem um auxílio precioso ao espectador -, da integração dos deficientes auditivos numa sociedade cada vez mais apressada e cheia de ruídos e, principalmente, da dificuldade que as pessoas têm - com deficiência auditiva mas não só - de se fazerem ouvir, mas também escutar e compreenderem, vozes, gestos, o coração. É ao coração que nos toca sobremaneira este filme delicado e terno, intenso, incapaz de nos deixar indiferentes.
duas irmãs vivendo os sonhos uma da outra

a dificuldade de comunicar sempre presente

pode um amor sobreviver de silêncios?
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domingo, setembro 05, 2010

FLASHES DE FÉRIAS


sexta-feira, setembro 03, 2010

FLASHES DE FÉRIAS

FELIZ ANIVERSÁRIO!!!
Ao 5º dia de férias, almoço em casa do irmão para comemorar os sete anos do meu sobrinho mais novo. A importância da família como suporte emocional e a antecipação do clássico do Sporting com o Benfica no bolo com o emblema da águia, ou, como se costuma dizer: "Até os comemos!". Festas e futebol à parte, a sensação de demasiado tempo perdido. A segunda semana tem de ser a sério, no que há para fazer, mas também no prazer, porque férias são férias e quando damos por isso já estão a acabar.

sexta-feira, agosto 13, 2010

MAR & SOL

SÁBADO- Sinto-me a derreter como um gelado ao Sol, apesar de me expor muito menos por estes dias. A independência tem algumas vantagens, mas que no prato da balança parecem sempre leves demais.

DOMINGO - Passaram-se três semanas e ao contrário do que previa, a vontade de escrever - e de muitas outras coisas - continua presa de movimentos e de entusiasmo. Com o mp3 já livre do pó acumulado durante vários meses de inércia, os meus pés levam-me por caminhos que conheço de cor. O tempo não parece ser bom conselheiro, não augurando para breve sinais de bonança.

SEGUNDA - a médica da empresa diz-me que tenho uma infecção - nada de grave - e a tensão baixa, o que não é propriamente dito uma surpresa para mim. Esqueço o orgulho e mando uma mensagem. Porque será que se insiste tanto em falar de orgulho, vencedores e vencidos quando o assunto são sentimentos?

TERÇA - Primeiro dia de praia a sério - com toalha, protector e essas coisas todas. Muito Sol, muito calor, água com boa temperatura. Ter-me-ia distraído se lá estivesse, mas nem sempre a cabeça acompanha o corpo. Uma grande distância raramente nos afasta dos problemas e o local da lua de mel ali tão perto. Ah, o chefe lembrou-se de perguntar pela data do casamento.
QUARTA - Segundo dia de praia. Mais do mesmo, até nas perguntas, agora por mensagem, um outro colega mas a mesma dúvida. Não me apetece responder. Não sei responder. Em contrapartida, as americanas voadoras começam a rarear, apesar das altas temperaturas se manterem.

QUINTA - A trabalhar das 7 às 24 horas, mais responsabilidade, menos tempo para dispersar os meus pensamentos. O país parece estar todo a arder quando se liga a televisão. Há carros de bombeiros destruídos, bombeiros mortos e muitas pessoas sem casa e cheias de medo. Dizem que só se fala dos bombeiros nestas alturas. Por isso gosto tanto quando não se fala deles, quando esses heróis silenciosos se quedam pelo anonimato e o nome do Zé, da Maria ou do Manel não fazem capas de jornais por terem perecido nessa estranha forma de vida que é a de arriscarem as suas vidas de graça e mesmo assim gostarem. Ninguém sabe quem são, porque têm esse bichinho no corpo, quais os seus sonhos, ao contrário de quem gosta de aparecer na televisão e de se auto-intitular de famoso, seja por desfilarem numa passerelle ou por pensarem que sabem cantar.

SEXTA - Sexo, Mentiras e Vídeo, como no filme. Será isto a isto que está confinado o amor? Onde estão os valores morais, os laços fortes incapazes de soçobrar como castelos de cartas ao mínimo sinal de tempestade, onde está o amor? A minha fé nas relações, nos sentimentos puros e nas pessoas anda bastante comprometida por estes dias. Resta-me a vontade e o gosto - ainda que enferrujado - pela escrita. Não é grande coisa, mas num naufrágio temos muitas vezes de agarrarmo-nos a qualquer coisa que nos mantenha à tona, por muito insignificante que possa parecer, e da médica ter dito que devia praticar natação.

domingo, julho 11, 2010

DA JABULANI ÀS VUVUZELAS





O primeiro mundial africano primou pela decência, da moral e dos bons costumes, negando a glória a selecções como a grande candidata Argentina ou a agradável surpresa paraguaia, frustrando as intenções de Diego Maradona e de Larissa Riquelme, que haviam prometido despirem-se se as suas favoritas conquistassem o tão ambicionado ceptro. (por questões de logística, que não de estética, colocaremos algumas fotografias de Maradona oportunamente. O espaço colocado ao dispor era tão exíguo que mal cabia um telemóvel).

segunda-feira, junho 21, 2010

DA JABULANI ÀS VUVUZELAS


Um outro olhar sobre o primeiro mundial africano.



Um dia tive um telemóvel igual, daqueles que vibram e vibram e...

domingo, fevereiro 14, 2010

PORQUE HOJE É DOMINGO!...


ROMÂNTICOS E CAVALHEIROS

Ricardo tinha a cena bem presente na memória, várias vezes a vira. Romeu, julgando Julieta morta, toma o veneno. Quando ela desperta da sua aparente morte e o vê, tombado e sem vida, mata-se também, porque para eles a vida de nada valia se não pudessem estar juntos. Romântico, pensava, apesar dos seus amigos do escritório lhe dizerem que algo assim seria impossível ou mesmo estúpido nos dias de hoje. Descrentes, cépticos ou realistas, pensava Ricardo, desdenham do amor lamechas dos filmes, dos príncipes e das princesas, dos sapos e das donzelas castas. A virgindade, os longos namoros do tempo dos nossos avós, as cerimónias de casamento, os vestidos brancos, são hoje conceitos difíceis de entender para muitos, à luz da lógica da razão. O Dia de São Valentim, ou Dia dos Namorados no seu termo popular não pode ser hoje, mais do que tudo o resto, um pretexto consumista para gastar mais alguns trocados e para vender umas quantas flores. Existe ou não romantismo nos dias de hoje? Cavalheirismo? Será que os homens já não oferecem flores, não abrem a porta do carro para elas sairem, não puxam a cadeira no café, para as namoradas/mulheres se sentarem? E será que a existirem homens românticos, cavalheiros e educados, o tipo do príncipe em vias de extinção, só se manifestam nestes dias ou são-no assim durante todo o ano? A maioria dos homens que conheceu eram como o Samuel, seu antigo colega da escola, o típico galã com um bigode à Clarck Gable, o princípe que depois de casado volta a virar sapo, longe das conquistas e dos jogos de sedução que terminam quanto muito na lua de mel e desse tal de cavalheirismo, afinal, apenas mais um estratagema para levar uma mulher para a cama. Será que iria suceder-lhe o mesmo depois do casamento?
Daniela não gosta de palavras doces, de poesia e de que lhe puxem a cadeira para se sentar. Considera os homens românticos uns chatos e as suas atitudes enjoativas. Será que pensam que pelo facto de serem homens são mais fortes do que ela, que têm de se armar em protectores? Sabe que Ricardo costuma dizer-lhe que o feminismo matou o cavalheirismo e que os homens são mais românticos que as mulheres, mas que sabe ele daquilo que agrada a uma mulher? Certamente que não promessas de políticos, mas de mais acção, alguns muscúlos à mistura, alguma malícia, arrebatamento ou mesmo uma pitada de sexo. Sexo sempre, do bom, selvagem, imaginativo, mesclado com palavras decididas e confiantes, vulgares. Em contrapartida tinha plena consciência que nenhum homem nunca iria oferecer-lhe um Taj Mahal, porque havia qualquer coisa nela que os intimidava, e não sabia se eram os óculos de aros de tartaruga, a frontalidade com que abordava temas que para muitos eram tabu ou mesmo uma pronunciada masculinidade no vestir. Sabia apenas que o romantismo e o cavalheirismo estavam fora de moda e que o máximo a que Ricardo se atreveria seria oferecer-lhe o último cd do Shayne Ward, que ouviriam antes de atenuar todas as suas diferenças numa querela sem tréguas sob os lençóis jogados displicentemente no chão do quarto. Talvez para o ano ele lhe oferecesse flores...

domingo, dezembro 13, 2009

IRMÃOS DE GUERRA

Não tenho particular predilecção por filmes de guerra, confesso, mas Irmãos de Guerra foi uma agradável surpresa, ao ponto de o considerar mesmo um dos melhores filmes que presenciei este ano. Do realizador Je-Gyu Kank, o filme conta a história de Jin-Tae, que vive com o seu irmão mais novo (Jin-Seok), sua mãe e ainda a sua noiva. Jin-Tae engraxa sapatos de forma a poder mandar o irmão para a universidade, quando deflagra a guerra da Coreia e os dois irmãos, embora por motivos diferentes acabam por ir parar ao centro da batalha. A partir dessa altura, para Jin-Tae, o seu único objectivo passa a ser o de ganhar a Medalha de Honra de forma a conseguir enviar o irmão de volta para casa, voluntariando-se para as missões mais arriscadas de forma a atingir rapidamente o seu objectivo. Só que a reacção do seu irmão e a entrada da China no conflicto acabam por dar um outro rumo à história, totalmente imprevisível. Irmãos de Guerra não é apenas um filme de guerra. É O filme. Com cenas de uma realidade e brutalidade notáveis a pedir meças às produções do género americanas, com muitas batalhas e bastante sangue, Irmãos de Guerra arranja ainda tempo para ser um dos melhores dramas que tive oportunidade de ver, incidindo sobremaneira na relação muito próxima destes dois irmãos numa guerra em que passa para segundo plano quem são os bons ou quem são os maus, até porque não é isso que interessa. A partir de certa altura, mesmo aqueles que julgávamos bons são vistos a cometer grandes injustiças e atrocidades, a provar que numa guerra não existe um lado certo. Por certo, apenas a convicção de que este é um filme a não perder, se gosta de grandes filmes e não se deixa impressionar facilmente com braços cortados e algum sangue à mistura.


sexta-feira, dezembro 04, 2009

HUMOR NATALÍCIO

SEXO VRTUAL

terça-feira, dezembro 01, 2009

NÃO TE QUERO


Se eu soubesse sonhar sonhava-te
Se eu soubesse amar amava-te,
mas eu já não sonho,
eu já não amo, vivo ou luto,
eu simplesmente aceito
(o que a vida já não me quer dar).
Vivi na ânsia de sonhos dourados,
embriaguei-me em ilusões desfeitas
escritas a sangue pel'amarga pena do destino.
Por isso não te quero amar
não te quero querer,
embalado pelos braços de uma ilusão.
Por isso não quero nem sonhar,
e porque não sonho não vivo
e porque não vivo não sofro,
não sofro porque não te quero
e se não te quero perco-te
e se te perco...

não me encontro.