domingo, dezembro 18, 2005

BESTA


E a besta irrompeu castelo dentro, disfarçada de peão, semeando caos e confusão entre as ameias dum reino sem raínha, profanando mitos duma suspeita valentia; desceu o seu manto gélido descobrindo as trevas, engolindo uma moralidade abstracta e fictícia, fez o leão balir como um cordeiro, fez-me caír do alto da minha própria altivez e arrogância; os pés de barro turvos, enlameados, fétidos, anjo há muito caído (em desgraça), cansado de calcorrear sozinho as vielas obscuras da perversão, velho pugilista de corpo moído, o orgulho ferido antes, muito antes do fim do primeiro assalto, sob o tremor duma insegurança mal-contida, dançarino na corda bamba, cabisbaixo, como um touro de raça prestes a ser capado; rola a cabeça como um troféu num chão escarlate dum castelo que tinha por meu, fendas morais por onde a coroa da minha soberba se perdeu. Sobrevivo exangue a uma morte precoce, abespinhado duma vingança nasciturna de quem quer e não se ergue, o medo, besta negra que s'encobre na bruma densa da cobardia e me encontra cativo em meu próprio corpo.

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