sábado, outubro 10, 2009

LENÇÓIS DA ALMA


Quem me dera ver-te sempre assim vestida
de promessas diáfanas, alimentar o ego perverso
nos caminhos descobertos da tua vaidade cuidada;
quem me dera poder guardar-te, cativa, quase humana
na memória fotográfica de um tempo por mim inventado,
resgatar-te devassa e submissa
no strip emocional de uma entrega despudorada e fictícia;
quem me dera poder passear a teu lado, mão na mão,
o teu beijo na minha boca, a minha língua nos teus ouvidos
soprando promessas que a mais ninguém confesso.
Quem me dera sentir a inveja mal-contida
nos olhos víperinos das fêmeas, o desejo
dos homens que passam e olham p'ra trás, p'ra ti;
quem me dera não sentir ciúmes dessas horas, tantas
em que dizes querer estar só e desses, tantos
que a todos beijas e a que chamas somente amigos.
Quem me dera poder um dia navegar indolente
no mar sem fim dos teus cabelos,
exercitar neles o tacto, tomar-lhes o gosto e o olfacto,
frondosas ondas que rebentam nas minhas mãos
em ávidos espasmos de desilusão.
Quem me dera descobrir um dia o anêlo sôfrego
dos teus lábios,
untar os meus dedos no mel da tua chama,
espalhar o meu veneno no teu corpo como unguento,
desfalecer no céu do teu colo sem um único lamento
à distância inultrapassável de dois dedos de conversa,
de um monólogo devasso tantas vezes decorado
no silêncio indiscreto do meu quarto,
onde a ideia de um desejo do teu corpo abandonado
se passeia e me desafia dia após dia, atrevida,
na penúria exaustiva das minhas noites brancas,
ousando as barreiras da imaginação, rasgando
os lençóis da alma...
e o tecido do colchão.

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