quarta-feira, outubro 11, 2006

POR TEUS PASSOS, DULCINEIA!

Não traço o meu Destino, não escolho o meu caminho. Sigo-te, simplesmente.
Que posso mais fazer dos meus pés s'eles já seguem de cor o rasto dos teus? Que posso mais fazer da boca qu'ainda nega a mais insofismável das verdades?, gritando "não", sussurrando "sim". Que posso mais fazer, se aos olhos por norma tristes e cansados salta o jeito descarado, com que, com subtil e encantadora destreza me desarmas da couraça de ferro que me trazia imune às perdições duma entrega despida de regras. Que posso mais fazer, Dulcineia, se aos olhos rejuvenescidos duma infância esquecida renasce a alegria pueril de quem brinca com o destino. Pudesse eu atrasar toda uma década num só dia, enganar o tempo ainda que por uma hora... mas a vida é madrasta, atira-te borda fora! Uma hora, duas... oito, nunca mais! Menos, bem menos! É longa a espera, eterna a saudade. Volto à Primavera dum tempo vencido, troco um jardim silencioso de palavras contidas p'las melânicas cores dum anjo precoce - foste tu que disseste: Angelical - Anjo ficaste, guru de um pecado ainda por difamar, onde sujei a alma ainda sem ser corpo, onde inventei o corpo já sem alma, vendida ao desbarato no desfazamento inapelável dos nossos dias (dos nossos anos), químeras insanes de um porvír demagogo, que me traz mais que velho, mais que trôpego (cansado, quase louco). É um apaixonado um louco? Galgo sombras duma noite eterna, vagueio na bruma dum cemitério de rosas murchas, cores, sabores, odores duma infância remota. Deito a fronte no jazigo da mente, onde mora o desencanto de um desejo premente. Por teus passos, Dulcineia, saio dos escombros, ergo a cabeça, lança em riste, cavaleiro da figura triste, numa peleja desigual contra antigos moinhos de vento. Somo óbitos, feridas por cicatrizar reabertas, vitórias morais, conquistas, sadomasoquismo de quem corre atrás de ilusões desfeitas. Corro atrás da inocência perversa e das promessas veladas que descubro em cada sorriso, pérfidos pedaços de paraíso; rasgo o peito na constante incoerência das minhas palavras e dos sentimentos a descoberto em noites sujas de um prazer proibido. Encontrado peregrino, perdido sem destino no sereno ensandecer dum sonho lúdico, algures púdico, uma fábula, uma miragem, um oásis intemporal, jovem Dulcineia, que tão jovem é, rédea à solta p'la vida no inviável Shangri-lá dum Quixote em bruto, enlouquecido.

Sem comentários: