quinta-feira, maio 25, 2006

SER FEIO

Tudo à minha volta me parece feio,
as pessoas, os actos, as palavras
que se dizem e que ferem sem pensar.
Tudo me irrita, mesmo a escrita
que teima em não saír com a fluência d'outros dias.
Sinto uma inqualificável vontade de gritar,
de ir à procura do atrito dispensável,
qual Dom Quixote, às cegas
com seus moínhos de vento privativos.
Sinto-me velho e cansado, incapacitado,
estranho em lugar incerto, bem vindo em lugar nenhum;
o que outrora parecia belo
toma agora tons de falsete,
os sorrisos são forçados, o sensual pornográfico
e as amizades jogos do mais puro interesse.
Tenho a mente suja, tudo me repugna e excita
quero desistir e não consigo.
Fujo aos olhares óbvios de sentidos
por maior que seja a sua indiferença,
ninguém me vê, ninguém sonha que existo,
ninguém quer sequer saber.
Passam a vida em loucas correrias
destinos incertos, causas perdidas
escravos do stress.
Fosse eu também... escravo d'alguém
que não de falsas morais.
Saem à noite, quais ratos de lúgubres tocas
soltam-se, gritam, dançam, bebem, caem, expoem-se
d'alma despida renascidos dos preconceitos esquecidos.
Amor... só de camisa
êxtase... num cheirinho d'heroína.
Noitadas até às tantas, dormir...
só depois das três.
Não sei mais quem sou
da razão das coisas
do que faço, do que penso
da pura lógica do bom-senso.
Mãe, diz-me o que é certo!,
qu'eu por certo ando errante.
Fujo dessa gente toda que ama
com a mesma força com que odeia, que ri, que chora.
Eu apenas sonho.
Vivo na ponta de uma caneta
enquanto a tinta me durar,
sonho denso de ser gente
ser igual aos outros, como tu
ser também imperfeito, feio
como o mundo à minha volta.

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